Friday, October 31, 2008

uma espera

Desde adolescente que tinha deixado o hábito de usar relógio. A partir do momento em que saia da casa que partilhava sozinho que o tempo de todos os seus gestos era marcado pelos outros: “pago o café quando o senhor que pediu para lhe desbloquearem a máquina receber o troco do maço de tabaco”, “atravesso a rua ao primeiro sinal verde depois da rapariga de verde entrar no autocarro que parou agora”.
Por vezes uma indecisão da parte da outra pessoa obrigava-o a demorar-se um pouco mais, mas nunca se impacientava. Uma espera era uma oportunidade para observar à sua volta, para descobrir algo novo no prédio da frente, um outro risco no carro vermelho estacionado ali perto.
Naquela tarde, tomava o café de sempre num passeio anónimo, escolhendo nos passos de alguém o momento de sair dali. Escolheu a rapariga que estava do outro lado da rua, tomando um café exactamente igual ao dele enquanto o olhava bem nos olhos. Quando deu por ele, o Sol começava já a descer no horizonte atrás dos prédios e os ponteiros dos relógios já tinham entontecido de voltas. Mas a decisão estava tomada. Ela olhava-o do outro passeio, parecendo tão vazia de impaciência quanto ele. Sorriam um para o outro, até ao momento em que o rapaz da mochila azul passou por trás dela e, sem querer, sem desconfiar por um segundo que fosse, fez com que duas vidas nascessem de novo.

Saturday, October 25, 2008

anónimo

Os tipos de letra foram inventados por um raptor que queria pedir um resgate por carta anónima mas não tinha revistas à mão.

Monday, October 20, 2008

sinal sonoro - ao terceiro ponto final serão reticências

Quando viu o fogo irromper pela porta, não hesitou: correu à parede, pegou no extintor, e com uma violência terapêutica esmagou o crânio do incêndio até o ver apagado.

Friday, October 17, 2008

terapia quitoso

A última coisa que um piolho faz na vida é catarse.

Tuesday, October 14, 2008

Jim Morrison \The Doors - Feast of Friends

o preço

Quando virei costas e voltei a olhar para a tela que levava na mão, não sei em verdade se o meu esgar foi de tristeza ou de surpresa: o meu Taj-Mahal em desenhos não passava agora de um rabisco ridiculo que os dias e a raiva rapidamente tratariam de destruir.

Thursday, October 2, 2008

o vazio

Se um dia acabarmos com os carros, o que é que vamos fazer às pontes gigantescas, às auto-estradas?

algo para mudar o Mundo (lembre-se disto no Metro)

Devia haver um Clube de Sósias do Vicente Moura.